setembro 15, 2002

“20 anos. Duas décadas de vida. Aos mais velhos parece pouco. Aos mais novos, é uma vida. Para mim, é uma constatação.
Quando se completam vinte anos de existência, parece que o mundo desaba sobre você. É essa a sensação real. Tudo cai em cima de você, tudo. Você já tem que ser responsável, tem que ter personalidade, tem que ser alguém! Mas eu não sou ninguém!!
Responsabilidade eu aceito, todos temos que ter, afinal chega uma hora na vida que precisamos abrir os olhos e dizer: “Algo está diferente! Eu não sou mais criança. E algo está errado! É preciso mudar!”. É trabalhar, é ter carteira de motorista, é ajudar seus pais, seus irmãos, tudo isso!
Mas ter personalidade formada e definida aos vinte anos, ah não!! Isso eu não aceito. Talvez seja específico para mim, talvez seja algo mais geral, o que sei é isso: eu não tenho personalidade definida e ponto!! E detesto quando as pessoas aceitam tudo que faço. É como se estivesse certo, mas eu sei que não está! E continuo a fazer, as mesmas coisas sempre, porque sinto que ninguém vai me dizer na cara que estou errado! E eu odeio as pessoas que aceitam o que faço sem dizer um ah!
Até meus pais eu não entendo. Querem que um cara de vinte anos tenha as convicções de um senhor de 37, faça-me o favor! Tudo bem, não estou aqui para ser ensinado, mas não estou para me jogarem na cara o que devo ou não pensar, fazer, agir! Eu quero ser eu mesmo, e só!!”

Muitas coisas mudaram de meus 20 para meus 23 anos. Conseguir um trabalho do qual tenho gostado muito. Estar aprendendo a viver longe de casa. Aprender a organizar minha própria vida, dar direção e sentido a ela. Dar meus próprios passos.
Talvez tenha sido exagero dizer aquilo sobre personalidade. Hoje, depois de três anos, acredito que a gente cresce carregando conosco características pessoais que nos irão acompanhar por muitos e muitos anos ainda. Podem ser virtudes, podem ser vícios adquiridos, não importa. São o que me definem e preciso aprender a conviver e, se possível, melhorar isso que trago dentro de mim.
Quanto às pessoas aceitarem o que faço, falo e afins. Ainda é uma verdade, mas é muito mais culpa minha, que me coloco como “dono da verdade” do que qualquer outra pessoa que conviva comigo. Entender isso foi o aprendizado mais duro que tive até o momento. As pessoas não têm obrigação de me entender, eu que decido se deixo elas se aproximarem ou não.
E tenho escolhido a segunda opção por um bom tempo. Porque me colocar como o “dono da verdade” faz de mim um egocêntrico. Para meus pais e meu irmão. Um expert, não muito aberto a amizades, para meus amigos. E a verdade é que o aprendizado foi duro, mas a prática está sendo de difícil assimilação.
Às vezes sinto que aquilo que meu irmão me disse certa vez, nos tempos do colégio, realmente seja verdadeiro. Que eu vivo para estudar/trabalhar, e não o contrário. Essa frase tem me perseguido por um tempo. Vai e volta em alguns momentos mais reflexivos. E engraçado que quanto mais tento desmenti-la, mais e mais sinto que torno-me a seguir tais palavras.
A questão da segunda opção. As pessoas me vêem como o ‘certinho’, o ‘inteligente’, o ‘dedicado’. Nestes últimos semestres tenho quebrado esse paradigma. As notas não andam lá essas coisas, mas a aprovação sempre vem. Às aulas tenha faltado algumas, dedicando-me a outras atividades, relacionadas a outras matérias que não aquelas que faltei, ou ao trabalho na empresa.
Mas as pessoas continuam a me ver com aqueles adjetivos. É difícil mudar quatro anos de divulgação de uma imagem e tentar apresentar uma outra no lugar. Afinal é a mesma pessoa, por que deveria ser diferente do que foi nos anos anteriores?
E eu mudei, sei disso. Antes, apesar da mesma fama no colégio, eu era o ‘quietinho’, que vivia estudando. Podia ser encontrado na biblioteca sempre, depois da aula, ou pelos bancos do saguão estudando alguma coisa. Exagero, mas devia ser essa a sensação. Para os outros, que para mim era o ‘normal’. Hoje são poucos os momentos em que me encontro na biblioteca, apesar de que utilizo mais o espaço da lanchonete para estudar. Mas se encontro alguém, trato de não ignorar, conversamos sobre assuntos diversos ou relacionados às matérias. Mas nada assim mais pessoal. Minha vida não é um livro aberto. Prefiro mantê-la trancada para qualquer outro dia, menos hoje.
Mas o tempo está passando, e sinto que os amigos que tenho hoje são legais, dividem as coisas entre si e convivem muito bem. E aí eu me sinto deslocado, com dúvidas que me arrependo de ter toda vez que me vêm à mente. Será que eu não faria diferença na vida deles se não os tivesse conhecido? Será que eu trouxe alguma coisa para a vida deles que eles não tinham antes de me conhecer?
Arrependo-me pela dúvida mesmo. Se não desse o melhor de mim para mudar meu jeito quieto, eles nem saberiam de minha existência. Digo isso por um amigo nosso que lembra a mim mesmo nos tempos do colégio. Quieto, estudioso, dedicado, não falta às aulas, a não ser em casos excepcionais, mas que não conversa muito com a gente, apesar de estar sempre junto nas rodinhas de conversa. E, incluindo-me, as pessoas notam sua ausência quando ele falta, e eu acho que só nesses momentos.
Talvez eu tenha ido longe demais nessa tentativa de mudar a imagem. Tenho derrubado um muro que construi nesses anos, e tenho notado o quão fácil é destruir, comparado ao trabalho que se teve em construir alguma coisa, desde um edifício até a reputação de uma pessoa.
Não sou perfeito. Ainda bem, ser mais chato do que já sou seria uma tortura para os outros. Mas meus defeitos ainda se sobressaem a minhas qualidades, na minha percepção. E ter pessoas me lembrando disso a todo momento não tem aliviado em nada isso.
Aos poucos vou alterando certos vícios. Outros têm raízes tão profundas que não me animo a mexer neles. Agora quanto às qualidades, nunca me lembro delas. Apenas quando tornam-se defeitos em determinadas situações. Preciso falar mais, conversar mais. Não sobre outros assuntos, sobre mim mesmo. E esse não sei se conseguirei tão cedo. Mas ao menos tentar, para não perder a batalha sem levantar a espada.
Sobre o mundo cair sobre nós. Prematuro em meus vinte anos achar aquilo. O mundo está sempre caindo, na perspectiva de um derrotista. Mas se olharmos de um outro ângulo, o mundo está criando situações para que você confronte seus medos e mostre que dessa vez pode conseguir fazer diferente. O destinoé algo filosófico, mas ainda acredito que somos nós que trilhamos nossos caminhos, a partir de cada passo que damos na vida, cada decisão que tomamos. Entender a importância de cada passo dado no futuro de nós mesmos é que deveria nortear nossas decisões. Conviver, aprender, melhorar e corrigir os passos dados anteriormente são um grande desafio em nossas vidas.

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